Existe o cinema de roteirista (cujo auge podemos dizer que foi nos anos 50 e 60, através de figuras como Billy Wilder, por exemplo); existe o cinema de diretor (anos 70 e 80, Truffaut e Godard de um lado, Coppola e Kubrick do outro); e existe o cinema de produtores. Nessa última categoria estão boa parte das séries que não ficam só numa trilogia, os filmes de adolescente, comédias pastelão e comédias românticas, filmes de terror e suspenses baratos, aventuras e filmes de perseguições em geral, animações infantis, filmes do universo HQ, adaptações de videogames e remakes de todo e qualquer filme que tenha feito sucesso no passado e você ainda se lembre (o caso mais ridículo me parece o próximo filme a ser lançado do Homem-Aranha). Ah, e claro: quase todos os filmes em 3D (não se engane, isso acontece desde os anos 50).
Essa pitoresca categoria tem suas famosas características:
1. visa o lucro (acima de tudo);
2. Procura sempre criar uma marca, gerando novas possibilidades de continuação (e remake) - e claro, mais lucro;
3. não precisa ser lá muito inteligente, nem inovar em muitos aspectos, nem ter diretores e roteiristas conhecidos;
4. Sendo assim, opta pelo roteiro manjado, de estrutura clássica, previsível e com final feliz (que não precisa ser necessariamente coerente; precisa ser FELIZ);
5. Tem um ritmo específico, edição a serviço da história, invisível, sem divisões de tela (a não ser que alguém fale ao telefone) ou cortes inovadores ou extremamente rápidos (o que também faz parte do 3D, que é para não convulsionar ninguém);
6. Pode ser de alto (ou altíssimo) orçamento, desde que vise um faturamento maior ainda (afinal, é de produtores que se trata);
7. Costumam ter caras conhecidas (quase sempre "A" mais conhecida - ou que ganha mais no mercado);
8. É preferível que estejam atrelados a outras possibilidades mercadológicas (se não vende boneco, dá para um videogame, uma série animada na TV ou mesmo alguns tantos comentários em comunidades do facebook);
9. Não, festivais nem morto, não ganhará nada mesmo. No máximo uma Comic-con (ainda assim com receio de que receba mais críticas que elogios);
10. Até porque, o filme deve sair o quanto antes das salas de cinema (a não ser que as pessoas queiram ver o filme mais de uma vez e vire cult) para dar espaço ao que vem depois (e que eles acham até mais legal): os dvds blu-ray com milhões de extras, os canais de tv a cabo, exibições em aviões, pay-per-view, etc.
Tudo isso para falar que hoje (dia 23 de setembro) estreia um (novo) clássico do gênero: Premonição 5. Ah, e em 3D.
Tem quase tudo isso aí em cima. Com algumas diferenças. A principal delas: ao contrário da maioria das comédias românticas e filmes de terror (já que é disso que se trata), ele é genial. Eis os motivos:
1. Consegue ser genial mesmo sendo o quinto filme da série e repetindo pela quinta vez a mesma fórmula, com todos os pequenos detalhes criados por ela (à exaustão).
2. Além disso, o filme não conta com nenhum ator famoso (boa parte dos atores vieram de series televisas e -quem já viu um filme da série vai entender- logicamente não estavam em nenhum Premonição anterior).
3. É dirigido por um estreante; Steven Quale é um expert de 3D, trabalha faz tempo com James Cameron, mas nem tem uma biografia ou foto no imdb (ainda).
4. (aqui o melhor) Você já entra na sala de cinema sabendo como ele vai começar, desenvolver e concluir (como em toda comédia romântica) mas aqui, essa é justamente a graça da coisa. Mais do que saber se a mocinha vai morrer ou não no final ou quem é o responsável pelas mortes (tentando atribui algum sentido), aqui você quer saber (como em todos os filmes anteriores da série) COMO eles vão morrer (e muito dessa lógica é puro nonsense).
5. São de fato as mortes mais elaboradas (e criativas) da história do cinema e você vê ao vivo, sem recriações posteriores em flashbacks feitas pelos legistas (que é a lógica televisiva atual, de séries como CSI ou Dexter).
6. Para melhorar: é em 3D (sério). É provavelmente o melhor uso já feito para o 3D. Ao invés de ver um alien gigante dançar para uma árvore ou um escandinavo genérico (que pensa ser de outro planeta) jogar um martelo de um lado a outro, juro que prefiro ver uma morte divertida (se isso for possível), pulando sangue, miolos e tripas em direção aos meus óculos (acaba sendo mesmo divertido no final das contas).
É pura diversão (e nisso nossos amigos produtores merecem todo o crédito). E o melhor: criaram um filme para se ver NO CINEMA. Rindo, gritando e se divertindo junto com todos os outros pirados devoradores de pipoca, que não conseguirão falar nada dessa vez que consiga estragar o seu prazer de ver o filme. Críticos vão dar no máximo duas estrelas (o que é inclusive coerente), mas que não tiram de nenhum modo o prazer de ver o filme. É diversão honesta, que entrega exatamente o que propõe (pelo menos dessa vez).
Um adendo: não sei se para fazer a promoção do filme ou para garantir apenas a diversão deles mesmos, Miles Fisher, um dos principais atores do filme (o que parece o Tom Cruise), publicou no Youtube um vídeo que ele também escreveu (além de atuar). Traz a lógica do filme para o que poderia ser um estúpido episódio de série de escola infantil, com músicas e tudo isso, visual meio anos 80, contando com todo o elenco do filme e mortes também elaboradas e criativas. Aí vai: