Neste domingo acontece a tão esperada cerimônia de entrega do Oscar americano. Na categoria edição concorrem: "Guerra ao Terror" dirigido por Kathryn Bigelow, "Bastardos Inglórios" de Tarantino, "Avatar" de James Cameron, "Distrito 9" de Neill Blomkamp e "Preciosa- Uma história de esperança", de Lee Daniels. Todos esses, com exceção do sul-africano Neill Blomkamp, também concorrem ao prêmio de direção (no lugar dele entra Jason Reitman com seu "Amor sem escalas"). E todos estes (e mais alguns) concorrem ao prêmio de melhor filme do ano (que conta agora com a indicação de dez filmes).
De todos, só não vi ainda o "Guerra ao Terror" mas mesmo assim me parece óbvia a previsão do vencedor; o próprio James Cameron subirá para receber o prêmio ao lado dos outros montadores: Stephen E. Rivkin e John Refoua. Além desse prêmio, aposto (não sozinho, obviamente) que Avatar ganhará uma coleção de estatuetas, assim como foi treze anos atrás com seu "Titanic". E isso se deve a duas razões muito simples: Avatar é uma revolução tecnológica; e representa um sucesso de bilheteria em tempos de crise. É assim um filme importante tecnicamente ao mesmo tempo que é importante economicante (para a Indústria do cinema).
Me parece curioso que um filme feito especialmente para o 3D ganhe o Oscar de edição. Explico: no 3D não se pode inovar em muitos aspectos estéticos e ele dita ritmos e cadências muito específicos. Não se pode por razões óbvias ter divisões de telas, cortes muito rápidos de um plano a outro, fusões - na medida do possível-, e a própria mudança de um plano a outro deve ser meticulosamente estudada. Isso porque qualquer um desses recursos pode confundir ainda mais o olho do espectador e deixá-lo realmente mareado. Aqui, no 3D, a montagem é quase que obrigatoriamente invisível; não é preocupante que só afaste o espectador da história, como que afaste dessa "experiência mágica", similar às montanhas-russas e parques de diversão em que o 3D tanto se apóia.
O Oscar que Avatar deve ganhar será por razões puramente técnicas. Cameron criou tantos elementos tecnológicos para fazer sua "Pandora" possível que de certa forma, ele mudou a forma como os editores se relacionavam com o processo de edição e como os mundos real e 3D se integravam (tanto na pós como na própria gravação do filme). Os editores trabalharam com uma quantidade ainda maior de materiais e com uma gama realmente maior de possibilidades. Nessa integração entre o que é filmado e o que é produzido em computação gráfica, os editores podiam escolher takes diferentes de cada ator para um mesmo plano em que eles apareciam juntos, já que o que importava era o áudio e a referência dos pontos gravados no motion capture (ou captura de movimentos), por exemplo. O sistema de câmeras que ele projetou inclusive permitia ao ator ver em tempo real como seria a sua integração ao ambiente 3D. Filmes com computação em geral trabalham a gravação e depois criam tudo em computação gráfica. Aqui, as duas coisas eram feitas quase que simultaneamente.
No site da Wired, uma série de vídeos explica melhor os conceitos por trás dessas tecnologias. Abaixo, a explicação relacionada ao que acabo de dizer, nas palavras dos próprios montadores.
Uma razão a mais para crer que o filme ganhará a estatueta de edição é que se avaliarmos os vencedores das edições passadas do Oscar veremos que em geral edição, direção e melhor filme andam bastante juntos. Isso se dá muitas vezes porque as pessoas não conseguem avaliar direito a edição do filme e acabam achando que se um filme é bom e a direção funciona é porque a edição também é boa. Dificilmente um filme ruim será vencedor dessa categoria, mesmo que seja feito de forma extraordinária. E nisso há o pensamento dominante em Hollywood (e que eu já levantei em outros posts aqui do blog) que a boa edição, premiável no Oscar, deve ser transparente; não deve aparecer ao espectador. Um interessante artigo do New York Times de 2008 explica melhor essa questão - para ver clique aqui.
Este ano me chamou especialmente a atenção a edição do filme "Preciosa". Nele vemos o uso de muitos recursos de edição cobrando sentido narrativo, como a fusão para o mesmo plano em dois momentos diferentes tentando entrar no desespero da protagonista; algumas composições dentro do plano, quando é simulada a fantasia que a protagonista cria em algumas situações; e até essa relação entre realidade e fantasia faz com que a edição assuma características muito diferentes para representar as duas situações. "Bastardos Inglórios" joga com muitos recursos já conhecidos do universo de Tarantino, mas dessa vez muito mais discretos do que em "Death Proof" ou "Kill Bill", por exemplo, em que a provocação e os experimentos iam muito mais longes - e por isso acho mais interessantes (esses filmes nem chegaram a ser indicados para o Oscar em seus anos nessa categoria). "Distrito 9" usa bem o formato de falso documentário e o ritmo em edição ajuda muito a entrar na história e comprar a mentira. Jogando com diferentes formatos, misturando imagens caseiras com imagens filmadas da história e imagens que supostamente seriam da imprensa, ele sabe jogar bem com seus recursos e também é bastante inovador nesse sentido. Senti falta da indicação de "Amor sem escalas" para esse prêmio, já que até o diretor está concorrendo em sua categoria; este é um filme que consegue criar sequências bem interessantes de edição - como logo ao início, cortando diferentes momentos em aeroportos dos protagonistas e suas malas - e tem bom ritmo - o ritmo das conversas entre George Clooney e Vera Farmiga são impagáveis.
Conclusão: entre todos esses, que usam a montagem de uma forma mais visível, e Avatar, que se pretende completamente invisível, o que veremos deve ser uma vez mais a consagração do invisível. Mas dessa vez, por razões completamente compreensíveis.
(Para se aprofundar no tema, recomendo essa reportagem, que também trata do mesmo tema).
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