quarta-feira, 24 de março de 2010

Shoptour embalado como reality show (ou: porquê o BBB é tão monótono e sem graça)

Para criticar é preciso conhecer. Isso é lógico. E é o que me impede em grande parte de fazer uma critica aprofundada sobre o onipresente Big Brother Brasil, atualmente em cartaz e em sua décima edição. Conhecer significa acompanhar um programa monótono e sem novidades, da qual estas dez edições não criaram novos elementos e sim repetiram fórmulas óbvias de sucesso. Ainda assim, com muito pouco já é possível conhecer os participantes, já que todo mundo só fala disso, eles estão nas homes de qualquer grande portal brasileiro e são de uma profundidade ímpar; com quinze minutos de qualquer programa você já sabe quem é o quê, faz o quê, desempenha que papel na casa. São personagens de um sitcom tosco mega produzido e patrocinado por milhões de marcas.

O gênero é indefinido. Humor tem muito pouco, drama tem o pior das novelas mexicanas, intriga é o que move 99 por cento do tempo (e se arrasta do início ao final com os mesmos motes), romance tem algum forçado ou induzido, já que a mega exposição e o Bial falando toda noite lembram constantemente aos participantes que eles estão na casa de todos os brasileiros. Programas gringos parece que deixam os participantes mais isolados, a ponto deles esquecerem uma hora que estão num ambiente controlado e passarem a agir algo mais naturalmente: tomam banho pelados, falam de forma mais natural, brigam menos encenados, fazem sexo sem muita preocupação. No Big Brother brasileiro, fazer sexo em frente às câmeras é algo como fazer sexo no quarto dos pais - com eles na cama ao lado (até porque o Bial leva o pai, a vó e o cachorro para o paredão toda semana). E daí que tudo fica mais artificial. O Big Brother gringo funcionaria assim mais como um experimento interessante de como funcionam as pessoas e como elas se adequam a um ambiente completamente anti-natural. As leis que regem o "universo" no início do programa viram outras completamente diferentes no final, a ponto dos participantes saírem meio malucos. Nesse caso, estaríamos mais dentro do filme "Cubo" (em que pessoas tinham que se juntar para decifrar enigmas de um gigantesco cubo assasino que ia se modificando com o tempo) do que de "Truman Show".

No Brasil não, tudo aqui é show. A Globo, com seu gigante departamento de choro (que pauta pelo menos 90 por cento de cada Jornal Nacional) gosta de mostrar a família do "emparedado" até que este se derrame em lágrimas; ficam eles (e nós) controlando o batimento cardíaco do "personagem", puxando as cordinhas: pouco batimento, mais família, mais lágrimas, mais batimento. A equação é simples e eficiente - a variável da equação é o que rege a TV Brasileira e que faz com que ela seja tão ruim como é: os famosos pontos do Ibope. Se na Inglaterra parece que já viram na mesma casa um político de direita e o líder dos Sex Pistols, aqui o que vemos é um bando de personagens planos e superficiais: piriguetes, marombados, popozudas e afins, que funcionam perfeitamente para alimentar os programas de fofoca dos concorrentes e futuras reportagens na balada de programas mais superficiais que eles mesmos. A Globo mesmo não aproveita quase nenhum desses participantes, até porque quem está no Zorra Total está lá há mais de 20 anos (isso sem contar as popozudas).

Fica então a pergunta óbvia: por que mostrar 24 horas de pessoas que não tem nada para falar, falando o tempo inteiro? Por que isso vende? E aí está a resposta, embrulhada em outra perspectiva. O que os participantes fazem não é vender o programa e sim vender o produto. Porque o que vemos na verdade é uma louca corrida ao merchand, esponjas de aço, motocicletas e lâminas de barbear competindo todos os dias para ver quem é que elas usam para vender mais (jogando um ou outro para o paredão, dando imunidade ou fazendo qualquer outra coisa sem importâcia). As provas são igualmente toscas e mal produzidas, até pelo espaço pequeno da casa; e o sorriso maroto de quem ganha e promete a moto para a vó, o tênis de correr para o cachorro ou a lâmina de barbear para a irmã bigoduda convencem o patrocinador, mas não o espectador. E nesse ponto, é melhor mesmo ter essas pessoas vazias e que "fotografam" bem vendendo os mais diversos produtos do que pessoas com um pouco mais de conteúdo - ou de respeito próprio, poder de crítica ou qualquer coisa do tipo.

O Big Brother Brasil mostra isso...

quando na verdade quer mostrar isso...

...para vender isso.

Conclusão: os participantes que fazem o programa chato ser ainda mais chato servem bem ao propósito máximo do programa, que é vender produtos. E nesse "vender o produto" vale ter as mais diferentes marcas movimentando a rotina da casa e passando por cima até de situações mais relevantes ou mais divertidas. É quase como se víssemos o comercial e trocássemos de canal quando começa o programa. O BBB é assim, no final das contas, um formato muito interessante usado em um programa monótono e sem novidade, da qual o público, por razões diversas, vira fã de carteirinha (Por marketing da emissora? Por interesse em saber o final da história? Por que não tem mais nada para fazer? Porque todo mundo -internet, pessoas no bar, outras emissoras - só falam nisso?) . Missão cumprida (ou comprida) para azar de todos.


Uma matéria que me pareceu mais lúcida, em meio às milhões de matérias caçadoras de pageviews dos tantos portais brasileiros é essa
aqui, de Mauricio Stycer, crítico do Uol, intitulada "Por que o Boninho busca a fama de mau?". Outra das coisas que não consigo entender é o diretor comentando quem gostaria que ficasse ou saísse no próprio twitter, que parece que acontece direto. Ele tenta assim mostrar que eles não manipulam o programa, fazendo algo completamente sem sentido. Acho que a idéia de chamar tantas personalidades do twitter para essa edição é tentar fazer com que estes não postem, para o diretor reinar soberano entre os adolescentes. Deve ter tido muitos lanches roubados na infância o pobre diretor de TV.

4 comentários:

  1. Rica, muito pertinente sua "não crítica". O fim do BBB seria na décima edição mas pelo visto ainda seremos presenteados com mais alguns anos de tão edificante passatempo...

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  2. Valeu, Vera. É engraçado que toda terça-feira temos o melhor e o pior da tv mundial: paredão do BBB aqui e capítulo do Lost lá. O lost disse que acabaria e vai acabar mesmo. Já o Big brother...
    Se eles ainda chutassem o balde algum ano e resolvessem fazer algo diferente... Mas não, não vai acabar nunca isso aí. E vai continuar a mesma porcaria. Um dia todos ainda seremos Ex-bbbs. hehehe.

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  3. Fala, Ricardo.

    Valeu pelo comentário no meu blog. Vim aqui pra responder uma pergunta que vc fez: Já que o formato funciona, depois de 10 edições, por que não "jogar" com personagens ou situações mais interessantes?"
    Pois a minha opinião: o povo gosta de lixo. Simples assim. Na inglaterra (se não me engano) fizeram uma versão do programa só com intelectuais e gente bem informada. Foi um fracasso colossal. Por quê? Porque o povo não pode (e nem quer) pensar. Povo gosta de barraco, fofoca, tosquice. E nesse ponto, o programa dá isso e um pouco mais.
    Se fizessem aqui uma versão só com gente "com conteúdo", o IBOPE ia ficar igual o da TV Cultura (que é a melhor emissora da tv brasileira, mas que dá 1, 2 pontos de audiência, e olhe lá!). Infelizmente.
    Parabéns pelo seu blog, já tinha lido e achado bem legal.
    Abs!

    Marcelo Pereira
    4 Elementos - Fábrica de Ideias

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  4. É Marcelo, concordo com você: o que o povo quer mesmo ver é barraco, baixaria, e é isso que gera assunto, que faz com que as pessoas fiquem revoltadas, que defenda o programa como defende o clube para que torce. Mas nem tanto ao céu, nem tanto à Terra, não é mesmo? No caso do BBB (e desse último especialmente) um pouco mais de conteúdo não ia mal a ninguém. Não precisa ser o pós-doutorando da Sorbonne mas também não precisa ser o... Dourado! hehehe.

    Pessoas um pouco mais legais e uma linguagem menos enlatada pro programa iam bem, até porque a edição e os recursos que a Globo usa no programa são bons. Material não falta. É o que eu acho: o formato é bom, dá pano para manga. O que falta é conteúdo (e não necessariamente "pessoas com conteúdo").

    (e aliás, barraco mesmo você teve no seu blog, hein? Mais uma lição de que uma pessoa radical com comentários grosseiros dá Ibope. hehehe. Mas seu blog também está de parabéns, não dá bola para isso não. Continua como sempre foi que vai bem).

    Abraços.

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