sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Nós somos Maus! (ou: os "aliens" de Distrito 9 e Avatar)

Os recentes "Avatar" de James Cameron e "Distrito 9" do sul-africano Neill Blomkamp partem de um mesmo princípio: nós somos maus.

Se no primeiro filme da franquia Alien (de Ridley Scott), uma assustada Sigourney Weaver tentava salvar a vida ao lutar com uma criatura misteriosa e desconhecida, em Avatar a própria atriz é quem tenta fazer os humanos entenderem e respeitarem esses seres de outro planeta, talvez não tão diferentes assim de nós. No primeiro se trabalhava com o desconhecido; o ano era 1979 (James Cameron, de Avatar, dirigiu o segundo filme da série, em 1986) e a Internet ainda não tinha ajudado a aproximar-nos de forma espantosamente rápida. Ainda convivíamos com o racismo, com problemas de imigração, com o medo americano do comunismo e o pleno desconhecimento de outros países do globo - o desconhecimento do ser extraterrestre era na verdade o nosso próprio desconhecimento. O medo do desconhecido era o próprio medo de conhecer-se profundamente.

Agora o desafio parece ser outro; seria mais unir-se em busca de soluções para enfrentar o aquecimento global ou a crise mundial econômica, por exemplo; e nestes dois pontos, sabemos que o desenvolvimento tecnológico e a economia capitalista que por um lado parece desenvolver o mundo, por outro, o destrói rapidamente - e isso não depende da ação isolada de uma ou outra nação. Daí a possível migração para um planeta desconhecido para deles tirar o que poderia ser a nossa salvação. No caso de Avatar é ainda pior: não se extrai para salvar a Terra e sim para gerar mais e melhores rendimentos, custe o que custar. Aqui a mensagem é clara (e por vezes, demasiadamente literária): a ecologia existe para nos servir, para nos fornecer material e para podermos usá-la como moeda de troca.

Em "Distrito 9" a mensagem é ainda mais interessante. Se os aliens estivessem aqui, estaríamos também explorando-os, marginalizando-os a guetos, tentando entender e explorar sua tecnologia bélica. Os aliens em si não interessam, integrá-los não faz parte do plano. E já os conhecemos muito bem, eles estão entre nós e já é coisa antiga; já não tememos mais o desconhecido. Agora tememos nossa própria índole e sabemos que a salvação não virá do outro planeta ou de possíveis descobertas tecnológicas; estamos na verdade fadados ao fracasso, aconteça o que acontecer. E se falávamos do racismo e do preconceito ao outro, aqui o filme nos fornece um eficiente tapa na cara. Não é que não conhecemos o outro ou o tememos; sabemos muito bem o que está do outro lado, isto já existe faz tempo, estes "aliens" estão a um bom tempo entre nós e mesmo assim, ainda não empregamos nenhum esforço em integrá-los. Os aliens aqui somos nós mesmos; a visão deturpada de uma parcela de nós. O fato da favela usada para a filmagem ser um local real e a equipe a ter usado após um verdadeiro remanejamento destas pessoas para novos blocos comerciais (de pessoas pobres e majoritariamente negras) é mais representativo impossível. Na cena em que eles usam o então mutante para matar um extraterrestre (o que o personagem viria se tornar depois), vemos semelhanças com outros filmes que abordam as mesmas situações: seja na arma da mão da criança para matar outra do "Cidade de Deus" de Fernando Meirelles, ou na mesma situação do "Diamante de Sangue" de Edward Zwick (dois filmes que também trabalham a questão racial e a vida nas situações-limite).

Mas nestes dois filmes, "Avatar" e "Distrito 9", existe a salvação: não da humanidade e sim do personagem. Nos dois, esta salvação se faz pela total transformação humano-alienígena. Ou seja: não é possível compreender o outro, não é possível conviver harmonicamente, não é possível salvar o nosso planeta do que quer que seja, como fazia no passado todas as histórias de super-heróis. Agora, parece que precisamos transformar-nos totalmente em outra coisa e integrar-nos a um mundo que não é o nosso. Para o nosso mesmo já não há mais salvação. Estamos fadados ao fracasso.

8 comentários:

  1. Super legal o blog, Rica. Mas acho que tá na hora de te contar...eu sou um alien.

    ResponderExcluir
  2. que bom que tenho dois aliens perto de mim, assim não me sinto tão sozinha.
    estou adorando te ler, pretinho!

    ResponderExcluir
  3. O ano do primeiro alien era 1979...

    ResponderExcluir
  4. Ei Assan, valeu pela dica. Confundi o primeiro filme com o filme do Cameron. Agora está tudo certo.

    ResponderExcluir
  5. Sensacional. E o alien saía de dentro da barriga da pessoa, e quando a pessoa descobria o "desconhecido" ela morria. Louco, não?

    ResponderExcluir
  6. ... e os militares no Alien queriam conhecer o alienígena, para aprender com ele, e a personagem principal é quem queria matá-lo. Já no Avatar é invertido, os militares querem destruir os alienígenas.

    ResponderExcluir